sábado, 19 de julho de 2008

A religião como cultura...

Acompanhe a análise de Maria Clara Bingemer, uma visão da religião como cultura.

Religião e cultura
Por: Maria Clara Bingemer
O mundo em que vivemos não é mais como aquele onde viveram nossos antepassados, nossos avós, as gerações que sempre nasceram e se criaram cercados dos símbolos, dos sinais e das afirmações da fé cristã e – mais do que isso – católica. Hoje vivemos num mundo onde a religião muitas vezes desempenha mais o papel de cultura e força civilizatória do que propriamente de credo de adesão que configura a vida. Mais ainda: vivemos num mundo plural em todos os aspectos e termos. Desejamos dizer com isso que a pluralidade advinda da globalização afeta não apenas os terrenos econômicos e social, mas igualmente os políticos, culturais e também religiosos.
Em nossos dias as pessoas nascem e crescem no meio de um mundo onde se cruzam, dialogam e interagem de um lado o ateísmo, a descrença e/ou a indiferença religiosa, e de outro lado várias religiões, antigas e novas que se entrecruzam e se interpelam reciprocamente. O Cristianismo histórico – e, portanto, também e não menos a fé e a religião em geral - se encontram no epicentro desta interpelação e desta pluralidade.
Hoje assistimos à privatização da vida religiosa, que vai de par com a autonomia do homem moderno, diferente da religiosidade que regia o mundo teocêntrico medieval. Cada um compõe sua própria “receita”religiosa e o campo religioso passa a se assemelhar a um grande supermercado assim como também a um “lugar de trânsito”onde se entra e se sai. A modernidade não liquidou com a religião, mas esta ressurge com nova força e nova forma, não mais institucionalizada como antes, mas sim plural e multiforme, selvagem e mesmo anárquica, sem condições de voltar a sua configuração pré-moderna.
O ser humano que viveu a crise da modernidade, ou que nasceu em meio ao seu clímax, e já nada em águas pós-modernas, diferentemente do adepto da religião institucional, que adere a uma só religião e nela permanece; ou mesmo do ateu ou agnóstico, que nega a pertença e a crença em qualquer religião é como um “peregrino” que caminha por entre os meandros das diferentes propostas que compõem o campo religioso, não tendo problemas em passar de uma para outra, ou mesmo de fazer sua própria composição religiosa com elementos de uma e outra proposta simultaneamente.
A experiência religiosa hoje, portanto, é constantemente desafiada a inculturar-se incessantemente, ou seja, a entrar incessantemente e a dizer-se dentro de uma nova matriz cultural. Nessa tentativa, defronta-se hoje com uma outra face que convive lado a lado com a da secularidade moderna, geradora da suspeita e do ateísmo, onde a Transcendência está submetida à constante e incessante crítica da razão e da lógica iluminista. E esta outra face é a face da pluralidade . Face esta que, por sua vez, implicará na existência de uma inter-face: a das diferentes tentativas do diálogo inter-religioso , da prática plurireligiosa e da religião do outro como condição de possibilidade de viver mais profunda e radicalmente a própria fé.

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